A dor invisível

Nº55| Para Refletir | Eric Pereira

Ela me dizia que muitas vezes se sentia cercada de pessoas e estava só, que via sorrisos por toda parte e ecoava distante em sua mente os bons dias e boas tardes animados e mesmo assim o vazio era constante. Algumas vezes sentia ter ganho algum tipo de “força extra” e até enxergava algumas coisas mais coloridas e se entusiasmava com algo e minutos depois se perdida dentro daquele entusiasmo e rapidamente seu sorriso se transformava em algumas lágrimas.

Ele tinha uma voz firme, se vestia muito bem e a primeira impressão que transmitia era de uma pessoa de sucesso, mas durante a sessão percebi que sim, tinha feito a leitura certa, porém depois do aperto de mão e sorriso no rosto, sua história se confundia com o que transmitia e entre uma respiração mais forte e outra ele dizia que o dinheiro já não mais preenchia sua “dor”, suas conquistas supria por um tempo, mas era cada vez mais curta e ele sentia uma dor que não sabia explicar e por mais que buscasse “o controlo”, vivia internamente descontrolado.

Atendo diariamente clientes com queixas emocionais diferentes, porém existem algumas destas pessoas que me relatam uma “dor invisível” que muita vezes chega devagar e vai ganhando espaço interno e na maioria das vezes nem elas sabem o que se passa, mas os relatos são sempre parecidos, como se elas se conhecessem e falassem sobre o que sentem. Na maioria das vezes se destacam frases como “Tenho tudo para estar feliz, mas sinto uma tristeza que parece vir da alma”, “Eu estou vivendo a melhor fase da minha vida e algo aqui dentro tem me consumido” e por mais que eu explore os acontecimentos, todas elas não conseguem explicar “o vazio” que as consome.

Eternos Insatisfeitos.

É como se estas pessoas fossem pessoas insatisfeitas que por mais que fizessem ou conquistassem, nada estivesse bom para elas e às vezes elas até conseguem aquietar a mente, a alma, mas é sempre momentâneo, pois preenchem este “vazio” com uma conquista, um momento, um pico de felicidade e depois tudo volta ao normal. Na realidade o normal delas que é sentir que falta algo e não conseguir explicar o que lhes falta. Lembro de uma senhora que atendi há poucas semanas atrás que vive em Londres, que dizia que depois de anos sentindo este vazio, hoje sente uma saudade de algo, de um tempo que jamais existiu.

Há sensivelmente uns 2 anos atrás, eu fiz uma live sobre dores invisíveis e se tiver interesse pode encontrá-la lá no meu blog e já faz alguns anos que venho ajudando estas pessoas a se descobrirem e tem sido para mim e para elas uma experiência incrível e recompensadora, pois em todos os casos que trabalhei até este momento, e não estou afirmando que isso é uma regra, ok? Mas todos os casos até este momento, estas pessoas sentem falta de algo que aconteceu na infância e na transição para a adolescência e não estou falando de viagens, roupas ou brinquedos, ok? Estou falando de afeto, de atenção, de carinho, de amor.

Comecei este artigo falando sobre uma pessoa que sentia sempre que estava cercada de muitas pessoas e sim, ela tinha uma família grande, amigos, faculdade boa e trabalhava em uma agência de publicidade com uma equipa divertida (palavras dela) e sentia-se só! Sempre só! Teve duas relações que não duraram, até porque ela não estava em busca de um namorado, ela precisava de uma figura masculina que cuida-se dela e depois de trabalharmos muito ficou clara a ausência de pai e mãe, mas ela sempre esteve cercada de pessoas, irmãos, tios, primos, cuidadoras, empregadas, mas os pais viajavam muito e quando estavam presentes, não estavam presentes, compreende o que digo aqui?

Lembro de em uma sessão ela me contar de uma lembrança distante dela chorando no quarto, no chão e os pais discutindo, a mãe pedindo para ele (o pai) pegar ela e ele gritando: “Você é que quis ter filha, agora cuida” e são mensagens como esta que em algum momento da infância foram “impressas” como tatuagem e que vão se juntando a outra e mais uma que vai constituindo (na minha opinião) a sensação de abandono, de rejeição.

Depois ela foi crescendo, se afastando, sentindo outras experiências na escola e ali já não eram as outras crianças que a tratavam mal, mas sim a sua postura já era de desconfiança, de reclusão e as outras crianças, apenas sentindo a decisão talvez até inconsciente dela, se mantinham distantes e mais uma vez ela confundia as imagens, as ações e somatizava a rejeição, o afastamento e desta maneira foi construindo aos poucos um olhar mais crítico diante do mundo, das pessoas.

Esta menina assustada se transformou em mulher e cresceu acreditando que precisava ocupar um espaço importante e se destacou nos estudos, no trabalho e trabalhava mais do que todos e porquê? Ela precisava de se destacar sempre, porque descobriu que todas as vezes que estava em uma posição de destaque ela ganhava atenção, respeito, palmadinha nas costas e claro que a sua alma descobriu uma maneira de se abastecer, mas nunca era o suficiente e como uma “droga”, ela precisava de mais e como todas as pessoas que se destacam, surgiram pelo seu caminho pessoas invejosas e traiçoeiras e ela não soube lidar com isso.

Se eu fosse falar apenas sobre ela daria um belo livro, a questão aqui é que algo que aconteceu lá atrás que ela quase não se lembrava mais contribuiu para todo um caminho e quando ela falou comigo a primeira vez, a sua queixa era: “Sinto uma dor, um vazio que nem sei explicar” e claro que eu em todos os casos sempre acredito que tem uma explicação, uma origem e aos poucos fomos “desenterrando” situações, olhando para elas, compreendendo uma a uma ressignificando.

Eu (Eric), já me senti um insatisfeito e por um bom período da minha vida sentia-me inquieto em tempo integral e estava sempre metido em algo que ocuparia o meu tempo, que me traria um novo desafio até um dia atender um empresário (ainda no Brasil) com as mesmas características minhas e ali durante aqueles 6 meses de intenso trabalho, me trabalhei também e compreendi o meu “vício” em estar sempre fazendo, ocupando a mente “e” me destacando, pois precisava do “reconhecimento” e sempre arrumei parceiros e sócios mais velhos e compreendi que fazia isso para substituir o pai que perdi muito novinho (2 anos).

Todos nós estamos sujeitos de vez em quando de sentir falta de algo, de querer suprir uma perda, mas atenção que não estou falando aqui de um caso isolado apenas e sim de dores invisíveis sérias que realmente levam uma pessoa a uma tristeza profunda, a uma depressão rigorosa e confesso que não gosto muito destas nomenclaturas como “depressão”, “ansiedade”, “pânico”, pois acho que são demasiadamente vagas e rotulam uma pessoa como (és doente e ponto!) e gosto de acreditar que ninguém o é…. Pode estar, mas estar ansioso é muitooooo diferente de ser ansioso, compreende?

Às vezes analisando as pessoas, percebo que por vivermos em um mundo competitivo, repleto de mudanças, passamos a maior parte do tempo “correndo”, dentro de um senso de urgência e não olhamos com mais atenção para o que nos acontece “ou” para como nos acontece, porém se observarmos, estamos na maioria das vezes sempre fugindo de estarmos com nós mesmos e okok o termo “fugindo” pode parecer um pouco estranho, mas na realidade, muitas de nossas ações são sim uma fuga da realidade, seja lá o que isso signifique.

Hoje vejo por exemplo muitos dos meus clientes que passam horas assistindo séries e vivendo “a emoção” que aquela série proporciona, outros vivem a vida de outras pessoas no Instagram e claro que com o tempo começam a achar suas vidas monótonas e chatas, pois estão se comparando com a vida de sonho que são postadas ali.

D.i.s.t.r.a.ç.õ.e.s e mais distrações para nos levar para qualquer lugar, desde que não seja para dentro de nós POR FAVORRRRR! Compreende isso? Estou sendo claro com minhas palavras? A sociedade, as grandes empresas de entretenimento têm em mãos um grande produto – entreter! Nos distrair e até acho que muitas pessoas precisam desta “anestesia”, pois não suportam sua realidade e aqui quero que aumente a sua atenção, por favor! Elas não suportam a sua realidade porque suas crenças acreditam que… E às vezes a realidade pode ser vista de outra maneira, mas para isso elas precisam estar conscientes, precisam olhar para dentro com carinho, com amor, com responsabilidade.

Eu adoro me distrair, mas em contexto de diversão e não de fuga! E óbvio que já fugi inúmeras vezes da “minha realidade” até eu poder olhar para ela com mais amor e quando o fiz até as dores que eram mais profundas foram abraçadas com um pouco da minha compreensão e as feridas que mais doeram ao longo da minha vida foram tratadas com um pouco de perdão e tudo foi se resolvendo com muito amor, ok, com algumas lágrimas também, confesso, mas mesmo nestas lágrimas tinha amor.

A vida não tem nada de complicado, porém às vezes carregamos algumas coisas que nos fazem vivermos mais pesados, mais tristes, mais pra baixo e como disse “carregamos” e muitas das vezes nem somos nós que colocamos aquele peso, mas carregamos porque alguém o colocou ali e fomos achando que era normal e continuamos a carregar, a aumentar, a fortalecer e não nos damos conta de que tudo o que estamos fazendo é continuarmos a alimentar o que um dia não foi alimentando com a emoção certa, então vamos colocando ali naqueles “buraquinhos” o que temos e às vezes até o que achamos ser o mais certo.

Não podemos nos culpar por tudo o que aconteceu, nem pelo que nos tornamos, por favor não! Devemos é aprender a olhar para tudo o que somos e não fugirmos de nenhuma de nossas versões e olharmos MESMO com atenção e colocarmos amor ali aqui, por todo lado, por toda a parte.

Uma vez em consultório disse algo parecido para uma jovem de 28 anos que chorava por sentir um vazio enorme e ela me disse chorando: “Como eu vou me amar, se me tornei isso que nem sei explicar?” e imediatamente eu respondi: “Este é o maior motivo para se amar! O se tornar isso é a resposta que você precisava”.

Às vezes “o” isso que ela disse e que nos dizemos é tudo o que precisamos para olharmos para nós sem dramas, sem historinhas sem treta e com amor dizer para nós mesmos, eu amo você e estou aqui para te ajudar no seu processo de transformação! Procure olhar para quem você é e diga a você mesmo que está para o ajudar. Se você não consegue olhar para si com amor, como as outras pessoas vão fazer isso?

Primeiro você deve acreditar, primeiro você deve querer se curar, primeiro você deve desejar compreender e quando você se tornar prioridade, todas as suas versões terão a sua atenção e o processo de transformação se iniciará.

Espero ter ajudado e já agora, tem alguma dor invisível? Só escreva sim ou não!

Até breve,